Advogado Imobiliário Curitiba
Especialista em Direito Imobiliário | Telefone (41) 3254-5608
Rua Lysimaco Ferreira da Costa, 761 | Centro Cívico - CEP 80.530-100 | Curitiba | Paraná |
Da adjudicação e do leilão judicial
Autores do artigo:
WINDERSON JASTER, especialista em Direito de Família e Sucessões, Direito Imobiliário e Direito Aplicado na Escola de Magistratura do Estado do Paraná e JOSÉ LUIZ DA MATTA COTA, graduado em Direito na Universidade Federal do Estado do Paraná.
1. INTRODUÇÃO
Quando o devedor deixa de cumprir espontaneamente com suas obrigações, sejam elas oriundas de um título executivo extrajudicial ou de uma sentença, pode o credor também contar com o auxílio do Estado-juiz para cobrar o que lhe é de direito.
Independentemente de já terem eles enfrentado uma normalmente longa batalha judicial para alcançar a declaração ou a constituição de direitos em um processo de conhecimento, as partes são obrigadas, neste momento, a se submeterem a um novo processo de cumprimento de sentença ou de execução.
Ocorre, então, uma expropriação forçada dos bens do devedor a fim de satisfazer o crédito. Dentre as diversas formas de se realiza-la, duas delas merecem atenção especial no presente estudo: a adjudicação e o leilão judicial. A partir de então, ambas as modalidades serão pormenorizadas, iniciando-se pelas suas respectivas conceituações até a demonstração de seus efeitos jurídicos para as partes.
2. DA ADJUDICAÇÃO
O Novo Código de Processo Civil, buscando sempre a satisfação do crédito da maneira mais célere e efetiva, previu a chamada adjudicação como a modalidade preferencial de expropriação a ser observada em um processo de execução.
Isto se dá na medida em que o instituto pode ser definido, nas palavras de Humberto Theodoro Jr, como "o ato executivo expropriatório, por meio do qual o juiz, em nome do Estado, transfere o bem penhorado para o exequente ou para outras pessoas a quem a lei confere preferência na aquisição[1]".
Em outras palavras, pode-se dizer que se trata ela de modalidade mais célere, uma vez que no lugar da soma em dinheiro devida, outro bem móvel ou imóvel penhorado é transmitido in natura, sem passar pelo extenso procedimento da arrematação, satisfazendo, então, o crédito.
Conforme mencionado já quando da definição da adjudicação, esta modalidade de expropriação, naturalmente, destina-se ao credor. Entretanto, o parágrafo 5º do artigo 876 do Código de Processo Civil prevê, excepcionalmente, a possibilidade de terceiros obterem a adjudicação, também sem o pressuposto da concorrência em hasta pública:
§ 5o Idêntico direito pode ser exercido por aqueles indicados no art. 889, incisos II a VIII, pelos credores concorrentes que hajam penhorado o mesmo bem, pelo cônjuge, pelo companheiro, pelos descendentes ou pelos ascendentes do executado.
Art. 889. Serão cientificados da alienação judicial, com pelo menos 5 (cinco) dias de antecedência:
(...)
II - o coproprietário de bem indivisível do qual tenha sido penhorada fração ideal;
III - o titular de usufruto, uso, habitação, enfiteuse, direito de superfície, concessão de uso especial para fins de moradia ou concessão de direito real de uso, quando a penhora recair sobre bem gravado com tais direitos reais;
IV - o proprietário do terreno submetido ao regime de direito de superfície, enfiteuse, concessão de uso especial para fins de moradia ou concessão de direito real de uso, quando a penhora recair sobre tais direitos reais;
V - o credor pignoratício, hipotecário, anticrético, fiduciário ou com penhora anteriormente averbada, quando a penhora recair sobre bens com tais gravames, caso não seja o credor, de qualquer modo, parte na execução;
VI - o promitente comprador, quando a penhora recair sobre bem em relação ao qual haja promessa de compra e venda registrada;
VII - o promitente vendedor, quando a penhora recair sobre direito aquisitivo derivado de promessa de compra e venda registrada;
VIII - a União, o Estado e o Município, no caso de alienação de bem tombado.
Nestes casos, quando deferida a outros legitimados que não o credor exequente, cumpre-lhes depositar o valor de avaliação, para que possa ser levantado por este[2].
Cumpre ressaltar, ademais, que a adjudicação somente pode ser feita, no mínimo, pelo valor de avaliação do bem, ainda que não haja necessariamente uma identidade entre estes:
Art. 876. É lícito ao exequente, oferecendo preço não inferior ao da avaliação, requerer que lhe sejam adjudicados os bens penhorados.
Neste sentido, caso o valor de avaliação do bem adjudicado seja menor que o valor do débito, prossegue-se a execução pelo saldo remanescente. Por outro lado, sendo maior que o valor do débito, o exequente fica obrigado a depositar a diferença.
Outras pertinentes observações devem ser feitas quanto ao procedimento.
Havendo concorrência entre os possíveis adjudicatários já mencionados no parágrafo 5º do artigo 876, os requerimentos habilitam os pretendentes a participarem de uma licitação a ser realizada entre eles. Humberto Theodoro Jr, neste sentido, leciona que “são indiferentes os graus de preferência gerados pela ordem das penhoras. O concurso será resolvido pela licitação e não pela graduação das preferências. Estas, por sua vez, se manifestarão sobre o produto da adjudicação e não diretamente sobre o bem penhorado. Obterá a adjudicação aquele que oferecer maior lance na licitação[3]”. Existem, de acordo com o autor, apenas duas preferências legais: a do cônjuge ou parente do executado, em relação a estranhos, e a dos sócios sobre a quota social penhorada, em face de estranhos à sociedade, inclusive os parentes.
Por fim, existem também as possibilidades de o executado impedir a adjudicação do bem. De acordo com Fredie Didier Jr, poderá ele (i) remir a execução, pagando integralmente o valor devido, (ii) substituir o valor do bem penhorado por dinheiro, nos termos do artigo 847 do Código de Processo Civil e (iii) remir apenas o bem penhorado, pagando somente o valor de avaliação do bem[4].
3. DO LEILÃO JUDICIAL
Em síntese, pode-se dizer que o leilão judicial diz respeito à oferta do bem penhorado aos interessados em adquiri-lo em um evento organizado pelo Estado-juiz.
Fredie Didier Jr, complementando esta noção, afirma que a alienação judicial se assemelha a um contrato de compra e venda. Em suas palavras, “exatamente porque com ele apenas se assemelha, não é um contrato de compra e venda. Há, na alienação judicial, a presença soberana do Estado, que exerce o poder de expropriar o patrimônio do executado, mesmo contra a sua vontade”. É, em decorrência disto, um “negócio jurídico bilateral de direito público: o Estado promove a alienação do bem e um terceiro propõe-se a adquiri-lo[5]”.
O Código de Processo Civil, ao iniciar suas disposições acerca desta modalidade de expropriação, já demonstra seu caráter subsidiário, prevendo-o como última opção frente à adjudicação (já estudada no tópico anterior), e a chamada alienação por iniciativa particular (tema de estudos futuros):
Art. 881. A alienação far-se-á em leilão judicial se não efetivada a adjudicação ou a alienação por iniciativa particular.
De acordo ainda com o Código em análise, uma vez não realizadas tais modalidades prioritárias de expropriação, haverá de ser designado o leilão conduzido pelo leiloeiro público designado pelo juiz[6], preferencialmente por meio eletrônico, ou, não sendo possível, em lugar designado também por ele[7].
Pertinente se faz ressaltar, ademais, o fato de serem legítimos a se submeterem a leilão todos os tipos de bens, sejam eles móveis ou imóveis. Não mais há que se falar na ultrapassada divisão entre leilão para bens móveis e praça para bens imóveis, como se falava sob a égide do Código de Processo Civil de 1976, anterior ao atual, de 2015.
Para que tenha sucesso este procedimento de expropriação, fundamental é que sua divulgação seja devidamente realizada. É neste sentido que surge também a figura do edital, instrumento promovido pelo Estado e que convoca os interessados a oferecerem suas propostas de aquisição do bem.
O respeito aos requisitos do edital, conforme leciona Fredie Didier Jr, é muito importante. A falta de qualquer um deles, nas palavras do autor, “pode levar à invalidade da alienação, obviamente se disso resultar algum prejuízo àquele se busca proteger com a exigência[8]”.
Para evitar situações nas quais não haja oferta pelo preço da avaliação do bem em um primeiro leilão, restando tanto a expropriação quanto a satisfação do crédito frustradas, o próprio edital já contará com a convocação para um eventual segundo leilão, a ser realizado em data posterior.
Isto se faz necessário, ademais, na medida em que nenhum dos leilões judiciais admite a chamada alienação por preço vil, tópico a ser abordado a partir de então.
3.1.DO PREÇO VIL
Em todo e qualquer processo de execução, quando bem sucedida a penhora e quando consequentemente se passa à expropriação dos bens, cabe ao magistrado definir, de maneira prévia, o preço mínimo do bem, suas condições de pagamento e as garantias que podem ser prestadas pelo adquirente, nos termos do que dispõe os artigos 880 e 885 do Código de Processo Civil.
Denomina-se preço vil, neste sentido, todo pagamento em leilão que seja abaixo do mínimo fixado pelo órgão julgador.
Para evitar a ausência de lacunas no ordenamento, entretanto, o legislador previu, no artigo 891 do mesmo Código que, nas hipóteses de o juiz não ter fixado preço mínimo de maneira prévia ao procedimento da expropriação, passa-se a considerar vil o preço inferior a 50% (cinquenta por cento) do valor da avaliação.
De acordo com Fredie Didier Jr, este dispositivo merece cinco considerações:
a) há também aqui uma presunção absoluta de vileza do preço; b) a regra não impede que se reconheça como vil valor superior à metade do valor da avaliação - as circunstâncias do caso concreto servirão de base para a avaliação do julgador; cria-se uma presunção absoluta, mas não se impede a concretização desse conceito indeterminado uma vez constatada a insuficiência do valor oferecido; c) o dispositivo também serve para definir que a não estipulação do preço mínimo, pelo órgão julgador, não leva à invalidação da alienação: a consequência normativa da não fixação do preço mínimo é a presunção absoluta prevista na parte final do parágrafo único do art. 891, CPC; d) no CPC-1973 (art. 692, CPC-1973), a vileza do preço gera invalidade da arrematação em segunda hasta pública; agora, no CPC-2015, a vileza do preço gera invalidade da alienação judicial em qualquer caso, mesmo no primeiro leilão; e) agora, é possível que o bem seja alienado, ainda no primeiro leilão, por preço inferior ao da avaliação, desde que não seja vil[9].
A única exceção ao percentual de 50% previsto em lei diz respeito aos casos de o bem imóvel penhorado pertencer a incapaz. Para tal hipótese, o Código de Processo Civil traz, em seu artigo 896, a exigência de que o valor da arrematação represente ao menos 80% do valor de avaliação. Não se atingindo esse valor, a alienação será adiada por até 1 ano.
Finalmente, Humberto Theodoro Jr leciona que, uma vez recusado o lance por preço vil, “é como se o leilão tivesse se encerrado sem licitante. Ficará, assim, aberta ao credor a possibilidade de requerer a adjudicação. O mesmo acontecerá se a arrematação vier a ser anulada por igual motivo. No leilão judicial o pagamento do preço correspondente ao maior lance deve ser imediato[10]”. Ainda de acordo com o autor, há, entretanto, possibilidade de o juiz permitir propostas de pagamento a prazo ou em prestações.
[1] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil: vol. III. 51. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2018.
[2] GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito processual civil esquematizado. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2017.
[3] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil: vol. III. 51. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2018.
[4] DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil: execução. 7. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Ed. JusPodivm, 2017, p. 908.
[5] Ibid., p. 914-915.
[6] Art. 881, § 1o O leilão do bem penhorado será realizado por leiloeiro público.
[7] Art. 882. Não sendo possível a sua realização por meio eletrônico, o leilão será presencial.
§ 3o O leilão presencial será realizado no local designado pelo juiz.
[8] DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil: execução. 7. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Ed. JusPodivm, 2017, p. 927.
[9] Ibid., p. 923.
[10] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil: vol. III. 51. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2018.